A Câmara dos Deputados aprovou na noite dessa terça-feira (28) o projeto de lei que acaba com a obri
A Câmara dos Deputados aprovou na noite dessa terça-feira (28) o projeto de lei que acaba com a obrigatoriedade de rotulagem para produtos transgênicos. Se aprovado, o PL 4148/2008, conhecido também como PL Heinze, permitirá que empresas que usam organismos geneticamente modificados (OGM) não coloquem o símbolo da transgenia nas embalagens.
O texto de autoria do deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), ex-presidente da Frente Parlamentar do Agronegócio (FPA), foi aprovado por 320 votos contra 135. O projeto é amplamente defendido pela bancada ruralista, que acredita que a rotulagem obrigatória prejudica os produtos brasileiros no comércio exterior.
Para a professora Marijane Lisboa, atual membro da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), a proposta fere o direito do consumidor de várias formas. Com o fim da obrigatoriedade da rotulagem dos alimentos transgênicos, o cliente não terá maiores informações para poder optar por um produto livre de organismos geneticamente modificados. “Direito do consumidor não é o direito de escolha, mas também o ter opção”, explica.
Segundo ela, tal medida deve levar os produtores de alimentos a produzirem conforme a ordem mercadológica, sem que seja levado em consideração os possíveis impactos de suas mercadorias na saúde de seus consumidores – a rotulagem das embalagens de produtos transgênicos ou não seria um incentivo para a produção diferenciada. “É um retrocesso absoluto. O mundo inteiro caminha no sentido de ou incluir ou de manter esse sistema de rotulagem”, avalia.
A professora também critica a forma como se deu a decisão dos deputados. Aprovada durante a noite, sem amplo debate popular, a proposta vai contra a Lei nº 4680/2003, que obriga a notificação de uso de material transgênico nos rótulos de produtos, e estabelece que as empresas são obrigadas a divulgar o uso de OGM nos casos que ultrapassarem 1% na composição final.
Segundo ela, ao contrário do projeto de lei, a atual legislação foi construída através de discussões plurais, revisões e consultas públicas.
Agora, o texto segue para análise do Senado Federal.
Cenário assustador
Marijane avalia que é difícil indicar a posição que deve ser tomada pelo Senado. “Estamos em uma situação de absoluta destruição de tudo aquilo que poderíamos considerar compromissos políticos por parte dos principais órgãos do poder executivo”, considera. “Somos presas de partidos políticos e de personagens que faz com que qualquer questão seja simplesmente moedas de troca na negociação de interesses e influências”.
Para a professora, a aprovação do PL Heinze na Câmara dos Deputados pode representar o pagamento de contribuições de setores interessados em políticas como essa. “É bem provável que a gente esteja assistindo o pagamento dos empréstimos feito na campanhas eleitorais”, aponta. “Esses projetos de lei estavam muito tempo no Congresso, mas de repente são tirados das gavetas e são aprovados rapidamente”.
Outras propostas de lei que afetam a biodiversidade brasileira também entraram na pauta do Congresso Nacional nessa semana.
Na noite dessa segunda-feira (27) a Câmara dos Deputados aprovou o PL n° 7735/14, projeto de lei conhecido como “marco regulatório da biodiversidade”. O texto retornou para os parlamentares após modificações do Senado e agora, segue para a sanção da presidenta Dilma Rousseff.
Dessa forma, o projeto aprovado pela Câmara contempla as indústrias farmacêuticas, cosmética, química e sementeira. Se sancionado pela presidenta Dilma, as empresas e o agronegócio terão mais facilidade para pesquisa e exploração do patrimônio genético de plantas e animais.O PL 7735 simplifica regras para pesquisa e exploração do patrimônio genético e para o uso dos conhecimentos indígenas ou tradicionais. Essa “facilidade” visa estimular a produção de novos fármacos, cosméticos e insumos agrícolas.
O texto do deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), também da bancada ruralista, atendeu a 12 das 23 emendas propostas pelo Senado, porém as 11 emendas rejeitadas eram, justamente, as que representavam alterações mais substanciais no sentido de aperfeiçoar a repartição de benefícios, ampliar a participação dos guardiões da biodiversidade e ao livre uso da agro e biodiversidade.
Também avança na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4961/2005, de autoria do deputado Antonio Carlos Mendes Thame que, em resumo, visa regulamentar mecanismos de patenteamento de seres vivos naturais e materiais biológicos. A lógica do patenteamento, que deveria ser de garantir benefícios ao inventor de algo inédito por determinado período de tempo, vem sendo usada por empresas ao redor do mundo como mecanismo para privatizar aquilo que a natureza fornece gratuitamente.
O PL trata de questões que podem afetar a saúde pública e a produção nacional de biomedicamentos, fitoterápicos, vacinas e diagnósticos. Países como Estados Unidos, União Européia e Japão que tem uma produção muito superior a do Brasil, seriam muito mais rápidos no desenvolvimento da patente e com isso, nenhum grupo de pesquisa ou indústria brasileiros poderão trabalhar com o produto.
O acesso à agro e biodiversidade, e conhecimentos tradicionais associados, possibilitado pelo PL 7735/2014, que garante legalmente a prática da biopirataria é complementado por esse PL que garante o estabelecimento de patente sobre o patrimônio genético e/ou conhecimento tradicional associado acessado pelas indústrias farmacêuticas, cosméticas, químicas e sementeiras.
Em trâmite desde março de 2005, na Câmara dos Deputados, esse Projeto de Lei chegou a ser arquivado no início desse ano, mas em março foi aprovado o pedido de desarquivamento do Deputado Thame (PSDB) e permanece aguardando parecer da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio.